sexta-feira, 23 de abril de 2010

Clarividência

"Este não é o Portugal deles, esta é a face póstuma de um Portugal que eles desconhecem e abominam, que vota politicamente errado (embora votem nos únicos que dão voz aos seus interesses, tão irracionais economicamente como todos os outros interesses, como dos professores, por exemplo, ou os dos gestores), que não é fashionable, não tem "marca" nem griffe, nem aparece no Time Out dos urbanos da moda, nem tem graça para ser gozado em qualquer programa menor de humor, como os que proliferam hoje por todo o lado. Se aparecem nos jornais é como arqueologia industrial, arcaísmo, anacronismo, ou, pior ainda, folclore local, que é visto com a distanciação de uma bactéria exótica.

Os problemas sociais são para muita gente uma maçada. Melhor: as diferenças sociais e a conflitualidade que daí surge são para muita gente uma maçada. O mundo deles é constituído por uma pirâmide social que começa nos abusadores do rendimento mínimo, passa para a "classe média baixa", para a "classe média" propriamente dita, a abstracção de muitas políticas, e sobe depois para os arrivistas com dinheiro, que o Independente tratava como o "novo dinheiro", os que vêm no jet set das revistas populares, para terminar na aristocracia do "velho dinheiro", o jet set invisível da verdadeira alta. Com esta pirâmide social, tão fictícia como os Morangos sem Açúcar, não há lugar para portugueses como os mineiros de Neves Corvo." José Pacheco Pereira, in Abrupto

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